Pesquisas e uso sustentável da água são caminho para driblar crise

Especialistas têm a missão de desenvolver tecnologias.
Agricultor tem a tarefa de colocar isso em prática.

 

Em fazendas experimentais, laboratórios e nas próprias propriedades são feitas pesquisas para encontrar uma forma de manter a agricultura sustentável, mesmo diante das adversidades climáticas. Os especialistas têm a missão de desenvolver tecnologias que ajudem o homem do campo a ter produtividade, plantas mais resistentes à seca e qualidade. E o agricultor tem a tarefa de colocar isso em prática, além de facilitar que essas tecnologias entrem em suas propriedades. Muitos ainda, com seu espírito empreendedor, transformam as próprias propriedades em uma área de teste e experimentações.

A tecnologia tem sido uma aliada há anos e possibilitou, por exemplo, que o Espírito Santo se tornasse uma referência na cafeicultura. Antes, o café do estado era considerado inferior. Hoje, a cafeicultura daqui é destaque no Brasil e no exterior. Aymbiré Fonseca, pesquisador do Incaper, explica que antigamente não se prezava, principalmente, pelos cuidados de colheita, pós-colheita e armazenamento do grão. Atualmente, isso é diferente, e a própria pesquisa estimula essa evolução. O Incaper, que está completando 60 anos, é um grande ator nessa área. Além do trabalho de extensão rural desenvolvido, dando apoio aos produtores, tornou-se referência na área de pesquisa.

Café Conilon
Existem várias Fazendas Experimentais do Incaper no estado, onde são desenvolvidas novas tecnologias para serem utilizadas pelo homem do campo. Ter unidades de pesquisas espalhadas em várias regiões diferentes é importante. Isso porque é preciso verificar como a planta reage às especificidades de cada local. A Fazenda de Marilândia, por exemplo, é referência nos estudo sobre conilon. Outras análises também são desenvolvidas com o robusta, em Sooretama. Ou seja, regiões com predomínio desse tipo de café.

Mas, nos últimos anos, têm sido realizadas pesquisas de conilon também na Fazenda de Bananal do Norte, em Cachoeiro de Itapemirim, e na Fazenda de Venda Nova do Imigrante, referência no arábica. Justamente para acompanhar essa mudança na produção do conilon, cultura que antes era desenvolvida em baixas altitudes, mas que hoje, com as mudanças do clima, também tem expandido para regiões mais altas.

O Espírito Santo é o maior produtor de café conilon do Brasil. E essa é uma área que conta com um trabalho robusto de de mais de 30  anos de estudos. No estado, já foram desenvolvidas e disponibilizadas nove variedades de conilon para os produtores. Hoje, só no conilon, são 40 projetos de pesquisa na área de melhoramento genético, adubação, poda, irrigação. Romário Ferrão, pesquisador e coordenador do programa estadual de cafeicultura, diz que essa seca dos últimos anos ainda serviu para que os especialistas trabalhassem em meio a todo o banco de dados de plantas em busca de selecionar variedades cada vez mais fortes. Dos dois mil materiais genéticos avaliados, 14 foram selecionados. O agrupamento desses 14 clones diferentes vai virar uma nova variedade que deve ser lançada no próximo ano.

Na Fazenda Experimental em Cachoeiro de Itapemirim, os pesquisadores têm tentado entender o mecanismo de tolerância à  seca de algumas plantas de conilon. Aymbiré relata que os pesquisadores, desde o início do programa de melhoramento, conseguiram identificar que algumas plantas têm mais tolerância à estiagem. Mas ainda não se conhece o motivo disso acontecer, o que já se sabe é que não é um mecanismo único.

O projeto, feito em parceria com a Ufes, busca entender justamente o que leva alguns pés de café a terem essa resistência. Os pesquisadores  comparam um mesmo clone em um ambiente de sombra e em um ambiente de sol. Assim vão avaliando o que muda de uma planta para outra. Quando esse mecanismo for entendido, será muito mais rápido fazer a seleção dos melhores exemplares .

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Os especialistas estão sempre desenvolvendo tecnologias que consigam tornar as plantas mais resistentes às adversidades climáticas. “Ninguém esperava, por exemplo, uma seca como essa dos últimos três anos como aconteceu, mas todo programa de café, seja de arábica ou de robusta, sempre teve em pano de fundo que todo o café, por mais produtivo que seja, fosse adaptado às condições de stress hídrico”, explica Aymbiré (destaque). O pesquisador e coordenador do programa de cafeicultura estadual, Romário Ferrão, aponta que a seca é um desafio. Isso porque a precipitação do estado está cada vez menor e, além disso, há uma distribuição cada vez mais desigual nas chuvas. O que demonstra a importância de se realizar pesquisas em diferentes ambientes e altitudes.

Café Arábica
A produção de café capixaba tem uma característica forte que a diferencia dos demais estados. Aqui há produção significativa de conilon e também de café arábica. E os estudos  desenvolvidos no arábica mudaram completamente o panorama de produção nos últimos anos. Em 2008, foi criado um programa chamado “Renovar Arábica”.  Os pesquisadores perceberam que as informações sobre as tecnologias desenvolvidas não chegavam como deveriam no campo. As lavouras precisavam ser renovadas dentro das novas bases. Maria Amélia Gava Ferrão, pesquisadora do Incaper, explica que no início desse programa, o produtor colhia 11,5 sacas por hectare, enquanto em São Paulo, Minas Gerais – dois grandes produtores – eram colhidas 23 sacas por hectare.

A proposta era que até 2025 a produtividade e a produção do arábica capixaba dobrassem, sem aumentar a área plantada, o que já aconteceu. Outra mudança se deu com o adensamento do café, ou seja, com a diminuição do espaçamento entre as plantas. Antes, colocavam-se 2.500 plantas por hectare. Agora,  também é o dobro. Todo esse avanço foi conquistado diminuindo a área plantada em 10%. Fruto de uma série de práticas implantadas de manejo correto, adubação, poda, adensamento, escolha certa de variedades.

No arábica, as pesquisas também envolvem a tolerância das plantas à seca. Os trabalhos são feitos sem irrigação. Os materiais genéticos das plantas são cruzados para se chegar a uma planta que, além dessa tolerância, tenha várias características, como: resistência à  ferrugem, qualidade e produtividade, porte adequado, uniformidade de maturação.

Por exemplo, existe uma planta muito produtiva, mas sensível à seca. É feito um cruzamento com uma outra planta mais resistente para que o resultado tenha o melhor de cada uma. Esse trabalho demora seis gerações. Então, são selecionados de 15 a 20 materiais que se adaptaram bem a diferentes condições. Maria Amélia ressalta  que é um trabalho bastante demorado; para se chegar uma linhagem pode levar  de 24 a 30 anos. Mas o resultado é uma variedade feita para as características de solo e clima do estado.

O Espírito Santo ainda não tem uma variedade de arábica própria, mas estudos  estão sendo feitos e o resultado deverá sair nos próximos anos. “O programa de pesquisa é dinâmico. As melhores cultivares de 20 anos atrás não são as mesmas de hoje, porque, naturalmente, vão ocorrendo mudanças climáticas. Nesse período, tivemos aumento de temperatura média em dois graus. Então, com certeza a adaptação do material é gradativa e vamos selecionando durante todo o processo,” explica a pesquisadora.

Os estudos tentam acompanhar a mudança do mundo. A cafeicultura vai se moldando e se ajustando a isso. Aymbiré relembra que na década de 70 a perspectiva – quando a ferrugem foi uma grande preocupação –  era que o café no Brasil acabasse. Não foi o que aconteceu, e o país continua a ser o maior produtor de café do mundo e o segundo maior consumidor. “O que acontece é que para cada característica climática que vai sendo alterada, você tem possibilidade de contorná-la”, acredita o pesquisador do Incaper, Aymbiré Fonseca. Exemplo disso são os cultivos consorciados de café com outras culturas que fornecem sombreamento. Quando se fala de  aquecimento, essa pode ser uma alternativa para diminuir a ação do sol e amenizar a temperatura das plantas.

Café Sombreado
É isso que está sendo estudado na Fazenda Experimental, em Pacotuba, interior de Cachoeiro de Itapemirim. A unidade pesquisa o consórcio de café conilon com árvores de ingá, gliricídia, bananeira e pupunha. A análise é feita por pesquisadores de áreas diferentes e busca descobrir as melhores espécies para se combinar com o conilon. Mauricio Dan, pesquisador do Incaper, explica que a equipe de estudos acredita que cada combinação de espécie produz um comportamento diferente no café.

A seca também ajudou os pesquisadores a observarem algumas características dessas combinações. Eles puderam perceber que o café solteiro, ou seja, sem consórcio, fica  mais fraco, com as folhas amarelas e produção menor. “Hoje, nós acreditamos que é uma possível alternativa pra gente ter um sistema mais adaptado aos extremos climáticos, porque quando a planta é combinada com outra planta correta, a gente consegue maximizar a produção, porque reduz os estresses climáticos” (destaque), diz Maurício.

O estudo já tem alguns indicativos dos melhores consórcios. A pupunha, por enquanto, é a que tem apresentado melhores resultados. O solo tem se mostrado mais úmido e descompactado e o café tem tido mais qualidade. O segundo sistema com bons ganhos é com a gliricídia. Com essa combinação, o solo tem armazenado mais água e matéria orgânica. Em seguida aparecem o ingá, a bananeira e, depois, o café solteiro. Várias são as medições feitas pelos pesquisadores, entre elas: a entrada de luz na área – assim como o excesso de sol faz mal, o excesso de sombra também pode fazer –  características do solo, como umidade e matéria orgânica; o aparecimento de plantas daninhas. Essa última área, das plantas daninhas, é a que Maurício estuda. Segundo o estudioso, no café solteiro há grande infestação de espécies daninhas mais agressivas, como o capim colonião. E a combinação com outras espécies têm funcionado como um filtro biológico. Em alguns desses sistemas a quantidade dessas plantas mais agressivas é menor.

Além dos benefícios para o conilon, existem benefícios diretos para o homem do campo . O sistema é bom para o bolso, pois a diversificação permite que o produtor tenha mais fonte de renda e de forma complementar. E outro ponto importante: o agricultor fica protegido da grande exposição ao sol, o que, sem dúvida, é um conforto importante.

Novas possibilidades também na pecuária
No final da década de 80, Jurandir Melado, engenheiro agrônomo, adquiriu uma fazenda com os irmãos na baixada cuiabana, no Mato Grosso. Em uma área de cerrado, resolveram formar pasto entre a vegetação nativa. Sem desmatar. Jogaram as sementes das forrageiras em meio ao local, intocado, e foram colocando cercas e formando os piquetes. Foi assim que, depois de criar uma pastagem com grande diversificação, Jurandir começou a colocar em prática um conceito criado por ele, o da Pastagem Ecológica. Percebeu que poderia ajudar o meio ambiente e dar renda ao produtor rural. A Pastagem Ecológica é uma junção de um conceito já existente, o do Pastoril Racional Voisin, e de outras atividades que diversificam as plantas forrageiras e unem o plantio de árvores na área de pasto, este último conhecido como sistema silvipastoril.

Jurandir explica que quando o gado fica numa mesma área de pastagem, esse é um pastejo contínuo. Quando se tem duas áreas, é pastejo alternado. E se o produtor tem a partir de três piquete já é considerada uma forma de rotação. “A rotação de pastagens é uma coisa tão essencial que inclusive não foi inventada por ninguém, a natureza exerce isso. Se hoje existem grandes manadas de animais herbívoros, na África, principalmente, é porque eles fazem uma rotação natural das pastagens”, exemplifica o engenheiro. A ideia do uso fracionado da pastagem faz com que, quando os animais cheguem na última área, a primeira já esteja recuperada. É uma forma de evitar a degradação do local  e de permitir que o pasto se desenvolva adequadamente. De acordo com Jurandir, a produção pode chegar a ser três vezes maior do que em comparação com o pastoril contínuo.

A proposta de Voisin, pesquisador francês que deu nome à  técnica, foi formalizada em 1959, e tem como uma das premissas a divisão das pastagens em vários piquetes. Mas existem várias outras questões envolvidas. O Pastoril Racional Voisin prevê duas “leis” para o pasto e duas para o gado: a primeira é a lei de repouso, ou seja, o pasto precisa ficar descansando até ter condições ideais de se desenvolver, de ser consumido; depois tem a lei da ocupação, que diz que a permanência do gado nos piquetes precisa ser breve, se não o animal  fica pisoteando a área e comendo os brotos do capim.

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A ideia dessa lei é que o gado não coma o capim que ainda está nascendo, que ainda está em desenvolvimento. A terceira ideia diz respeito ao  produtor. É preciso dar para cada animal a alimentação que ele necessita, em quantidade e qualidade, e para isso é necessário  levar em conta as especificidades de cada um. Por exemplo, se é uma vaca de leite, a comida tem que ser de melhor qualidade. E, por último, a lei dos rendimentos máximos. Segundo o preceito, o gado não pode ficar mais de três dias numa mesma parcela de área, porque no final desses dias o rendimento cairá.

Todas essas ações devem ser implantadas Pastejo Ecológico. Jurandir aplica, como dito, a diversificação das plantas forrageiras e o plantio de árvores em meio ao pasto, aliado à prática  Voisin. Sobre o plantio de árvore, um dos benefícios é a própria sombra que é fornecida para os animais. O engenheiro explica que já está comprovado que o conforto térmico faz com que a produtividade do animal aumente de 20% a 30%. Além disso, a árvore é uma bomba de adubação. Ela retira do subsolo os nutrientes e depois devolve isso por meio das folhas e dos galhos, que caem e se decompõem. Outro ponto positivo é a ajuda no  controles de pragas: as árvores abrigam inimigos naturais importantes.

Essas são maneiras de utilizar o conhecimento da própria natureza na agricultura. E Jurandir acredita que esse é o caminho, mas, para ele, as universidades ainda precisam se abrir mais para esse tipo de discussão. “As principais tecnologias que vão realmente revolucionar e trazer solução para os principais programas da humanidade são tecnologias da natureza e não tecnologias de laboratório. São coisas que a inteligência do planeta já vem fazendo há milhares de anos e a gente simplesmente desconheceu isso”.

Exemplo real
Há cinco anos, João Guasti, produto rural de Linhares, abriu as porteiras para o sistema ensinado por Jurandir. Ele já acompanhava algumas palestras do professor até que teve a oportunidade de implantar o sistema durante a execução do programa Corredores Ecológicos, que já não existe mais. Primeiro, ele instalou as cercas elétricas que delimitam os piquetes. Depois, há três anos, começou o plantio de árvores. Foram 300 mudas e 10 hectares destinados para o projeto. Logo de início já percebeu os benefícios da rotação para a qualidade do pasto. “Você introduz o animal na pastagem na hora certa. Aí você respeita o ciclo da leguminosa, o ciclo do capim. Coloca o animal para comer na hora certa”, conta o produtor.

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As árvores não estão só no pasto. João tem uma Reserva Legal na propriedade, herança do pai que já se preocupava com a preservação da mata. Ele  continuou esse legado, ampliando e formando uma área de mata em outra parte da propriedade. Por isso, quando resolveu plantar também no pasto, ouviu alguns comentários desconfiados.”Muitas vezes falam que eu já tenho árvore de sobra no terreno e estou plantando mais. Às vezes falam que a gente é até meio doido. Mas não acho que tô errado não, acho que tô certo. No futuro isso vai ficar para os meus filhos” (destaque), observa o agricultor.

Infelizmente, a seca atrapalhou o desenvolvimento da Pastagem Ecológica na propriedade de João. A falta de chuvas, naturalmente, dificultou o desenvolvimento das árvores plantadas. Mas isso não desanimou o produtor. Ele já conseguiu observar que, quando os vizinhos já estavam sem pasto, ele ainda tinha. O pasto também acabou lá, mas demorou mais. Agora, o produtor espera que a época das chuvas chegue, para plantar mais árvores e continuar sua experimentação. Isso porque muitas vezes o próprio produtor testa quais mudas vingam e quais não estão se dando bem com o ambiente, por falta de pesquisas específicas nessa área. Porém, não é a seca, nem a desconfiança que vai abalar a vontade de João em fazer as coisas diferentes. “Eu penso que o futuro é isso aí. A gente trabalhar com a natureza ajudando a gente. Não contra a natureza, trabalhar a favor da natureza. Ela dá o retorno”, acredita.

 

Fonte: http://g1.globo.com/espirito-santo/agronegocios/noticia/2017/01/pesquisas-e-uso-sustentavel-da-agua-sao-caminho-para-driblar-crise.html

 

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